Não é segredo pra ninguém que o rock surgiu na década de 1950 a partir da fusão entre gêneros musicais de origem afro-americana, como o blues e o jazz, com gêneros de origem branca, como o country e o folk. Mas por conta de sua gênese ter se dado nas zonas urbanas, a mistura tomou contornos bastantes distintos daqueles que eram habitualmente atribuídos às práticas musicais rurais, o que impactou diretamente na estética do rock 'n' roll.
Antes de mais nada, convém esclarecer que o rock não surgiu como um movimento, ou seja, não foi organizado por um grupo de pessoas com estética, propósitos e ideais específicos, mas sim como manifestação popular, e assim, não havia uma unidade geradora, resultando em características estéticas distintas, conforme o artista e suas influências culturais. Mas havia basicamente dois elementos compartilhados entre todos: a guitarra e a dança. O primeiro, um instrumento recém-criado que não adotou valores de uma tradição, ao contrário, estava inclinado a inovações e experimentações, e que teve seu desenvolvimento intimamente atrelado ao novo gênero musical, em contribuição conjunta para a incipiente linguagem estética. A segunda, abraçada com fervor pela juventude, que se via instigada pela sensualidade, pelo frenesi e pela liberdade – ao contrário do que ocorria com outros gêneros musicais dançáveis, com suas danças comportadas e cheias de regras –, numa integração até então inédita, de proximidade e interação entre o público e os músicos.
Naquela época, os jovens não ocupavam um lugar ativo na sociedade, e eram vistos simplesmente como pós-crianças ou pré-adultos, sem que existisse a compreensão das peculiaridades dessa fase da vida, o que implicava na falta de tratamento adequado aos adolescentes. Assim, a guitarra e a dança foram adotadas pelos jovens como símbolos de liberdade, contestação e rebeldia na tentativa de extravasar as angústias proporcionadas pela rigidez e banalidade de um período marcado pelo conservadorismo, moralismo e autoridade patriarcal. Mas se por um lado havia jovens encontrando um espaço na sociedade, vendo-se representados e pertencentes a um grupo, havia também adultos abismados com toda essa transgressão às normas vigentes, ao estabelecido, que se sentiam ameaçados diante das mudanças de postura de jovens que já não aceitavam mais serem moldados para se tornarem algo como "adultos plenamente funcionais em uma sociedade altamente consumista e moralista". Portanto, ao mesmo tempo que o rock deu origem à rebeldia adolescente, também gerou o reacionarismo em adultos que, com o passar do tempo, cederam às características sedutoras do rock, fazendo surgir o conservadorismo dentro deste gênero musical. Curiosamente contraditório.
Referências:
CHACON, Paulo. O Que é Rock. 5. ed. São Paulo: Brasiliense, 1989. 80p. (Coleção Primeiros Passos 68).
COVACH, John; FLORY, Andrew. What’s That Sound?: an introduction to rock and its history. 5 ed. New York: W. W. Norton & Company, 2018. 672p.
FRIEDLANDER, Paul. Rock and Roll: a social history. 2 ed. New York; Abingdon: Routledge, 2018. 400p.
LUIZ, Gisele Cristina. O Rock e a Invenção da Juventude. In: ALMICO, Rita et al. Rock: o livro. São Paulo: Hucitec, 2022. p. 28-40.
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