Guitarras barítono: aquele grave cavernoso que você tanto queria!


Recentemente, a após anos de procura, pesquisas e conversas, finalmente conseguir comprar uma guitarra barítono, mais precisamente uma Aria Pro II J-B’tone. Mas sempre que trago o assunto para uma conversa, (quase) sempre vem a pergunta: "Hã?? O que é uma guitarra barítono? Pra que serve?". E essa foi minha motivação para o artiguete de hoje – além, é claro, da minha paixão pelo assunto.

Bom, em primeiro lugar… Não. Uma guitarra barítono não serve para tocar junto com um cantor barítono. Até pode ser o caso, mas não é exatamente esse o propósito. Barítono é a voz masculina que fica entre as extensões vocais de baixo e tenor. Ou seja, o barítono é o cantor que tem a voz mais grave que o tenor, mas não tão grave quanto o baixo. E a mesma premissa se aplica às guitarras: uma guita barítono é mais grave que uma guitarra "convencional", mas não tão grave quanto um contrabaixo. Vamos entender o porquê.

Guitarras convencionais costumam ter comprimento de escala (ou scale length, a distância entre o nut e a ponte) por volta de 25" (polegadas). Uma Gibson Les Paul, por exemplo, tem comprimento de escala de 24.75",  enquanto as Fender Stratocaster têm 25.5". Já as guitarras barítono (sim, "barítono", e não "barítonas", já que se trata de um adjetivo que não varia quanto ao número e gênero) são maiores do que 26". A minha já mencionada Aria Pro II J-B’tone tem 30". Mas daí vem a inevitável pergunta: a pra que raios serve esse tamanho de escala maior? É pra quem tem mãos grandes?


Bom, ainda que uma escala maior possa ficar mais confortável para quem tem mãos muito grandes, não foi com esse intuito que as guitarras barítono foram criadas  aliás, a primeira, ou uma das primeiras, a chegar no mercado foi a Danelectro Bartione, de 1956. A razão principal é simples: afinações baixas, ou "low tuning". Como as guitarras convencionais têm escala mais curta (24.75" ou 25.5"), elas requerem calibres menores de cordas para que fiquem com tensão apropriada para a afinação E padrão, que é a mais comum para guitarras convencionais. Além disso, elas não são apropriadas para afinações muito baixas, como B padrão (standard) ou ainda mais graves, como A, G ou F. Com calibres maiores de encordoamentos (0.012 ou 0.013) nas guitarras convencionais, é possível chegar a afinações mais baixas, como D ou C, mas abaixo disso, é muito provável que as cordas fiquem flácidas, o que prejudica a tocabilidade e aumenta a probabilidade de trastejamento, que é algo que todo guitarrista detesta. Afinal, essas guitarras foram projetadas para afinação E (Mi) padrão: E, A, D, G, B, e (da corda mais grave para a mais aguda, ou E2, A2, D3, G3, B3, E4, cujos números indicam a oitava à qual pertence a nota correspondente à corda solta).

Já o comprimento de escala maior das guitarras barítono permite com que sejam possíveis afinações mais baixas sem comprometer a tensão adequada das cordas, ou seja, sem que fiquem esticadas demais (o que prejudica a execução de técnicas de expressão, como bends e vibratos, e facilita que as cordas arrebentem) ou frouxas, como já dito acima. Assim, com encordoamentos 0.013 (.013–.062) ou 0.014 (.014–.068), é possível chegar a afinações como B padrão (B1, E2, A2, D3, F♯3, B3), A padrão (A1, D2, G2, C3, E3, A3) ou até mais graves.

A minha Aria J-B’tone, por exemplo, está afinada em A standard (veio de fábrica afinada em B) com encordoamento .013. Mas minha ideia é trocar o encordoamento para um .014 para deixar as cordas um pouco mais tensionadas (a tocabilidade da minha, com cordas .013–.062, está próxima a de um encordoamento .009 em escala convencional, e eu prefiro tensão equivalente a de encordoamento .010 ou .011) e quem sabe até descer a afinação para G standard. E sim, encontrar encordoamentos de calibre mais elevado é um problema aqui no Brasil, assim como também é muito difícil encontrar guitarras barítono neste país (por isso o "[após anos de procura []" logo no início deste artigo), o que leva muitos guitarristas a recorrer a guitarras feitas por luthier, que possuem valor elevado e revenda difícil.

E por fim... Como saber qual é a tensão ideal para o encordoamento? Não existem valores "corretos", mas é possível usar um calculador de tensão de cordas para saber qual a tensão de determinado encordoamento em um certo comprimento de escala e compará-la com os valores de um encordoamento "padrão" (.009, .010 ou .011) em uma guitarra de escala convencional (24.75" ou 25.5"). Por exemplo: se você gosta de tocar a sua Strato com encordoamento .010, então verifique no calculador de tensão de cordas qual é a tensão de cada corda (conforme o valor de calibre indicado pelo fabricante) em escala de tamanho 25.5" (Strato) e busque chegar a tensões semelhantes em cada corda de um encordoamento de calibre mais grosso em sua guitarra barítono, assim você terá mais ou menos a mesma tocabilidade em ambas as guitarras. No caso da minha J-B’tone, eu coloquei, nStringjoy String Tension Calculatoro valor "30" (comprimento da escala) no campo Overall Scale Length (in.) , depois selecionei "A3, E3, C3, G2, D2 e A1" (de cima para baixo) nas listas suspensas da coluna Pitch, e por fim, selecionei os valores ".013, .017, .026, .036, .046 e .062" na coluna String, que é o tamanho do calibre de cada corda do meu encordoamento 0.013. Assim, eu obtive os valores de tensão de cada corda na coluna Tension (lbs.) e os comparei às tensões das cordas de um encordoamento .010 em uma guitarra de escala 25.5" para saber se o resultado ficaria do meu agrado, o que me levou à conclusão de que um encordoamento .013 mais pesado ou .014 pode ficar com tensão mais próxima do que considero ideal. O vídeo abaixo é uma boa ajuda para o cálculo de tensão das cordas:

Espero que este pequeno artigo tenha ajudado você a entender o que são as fascinantes guitarras barítono. Inicialmente utilizadas na surf music e no jazz, hoje as guitas barítono têm espaço mais do que garantido nos corações dos guitarristas de gêneros que levam o conceito de "pesado" ao extremo, como djent, metalcore, death metal, stoner e o meu querido doom metal. Somadas a níveis elevados de saturação (distorção ou fuzz), as guitarras barítono são capazes de arrancar tinta das paredes!

Para alguns, o tamanho maior da escala pode ser um problema, já que isso implica em distâncias maiores entre os trastes, e consequentemente, em casas maiores, o que pode prejudicar o desempenho em velocidade ou causar desconforto com a abertura dos dedos ao fazer acordes, o que leva certos guitarristas a preferir guitarras de 7 ou 8 cordas, que obviamente possuem maior largura no braço, o que, por sua vez, pode incomodar outros guitarristas. Enfim, é tudo uma questão de gosto pessoal. Eu fiz a minha escolha, e agora você sabe qual foi.

Abração e até o próximo artigo.


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